Gestão de dados de pesquisa em bibliotecas universitárias brasileiras
Research
data management in brazilian academic research
libraries
Gestión
de datos de investigación en bibliotecas universitarias brasileñas
Letícia Guarany Bonetti
Universidade de
Brasília (UnB)
Brasil
Fernanda Passini Moreno
Universidade de
Brasília (UnB)
Brasil
Submetido em: 19/04/2021
Aceito em: 14/06/2021
Publicado em: 28/10/2021
Licença:
Autor para correspondência: Letícia
Guarany Bonetti
Email: leticiagbonetti@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3012-8465
Como citar
este artigo:
BONETTI, Letícia Guarany; MORENO, Fernanda Passini. Gestão de dados de pesquisa em bibliotecas
universitárias brasileiras. REBECIN, São Paulo, v. 8, edição
especial, p. 01-13, 2021. DOI: 10.24208/rebecin.v8i.244
RESUMO
No contexto atual da produção em massa de dados por
pesquisadores, fala-se cada vez mais sobre a importância dos dados na ciência,
principalmente no cenário do novo paradigma científico: o da Ciência Aberta.
Para que os dados possam ser aproveitados em seu potencial máximo para o
desenvolvimento científico, é preciso que haja uma adequada gestão deles. Nesse
cenário fala-se sobre o papel das bibliotecas universitárias como pioneiras na
oferta de serviços de gestão de dados de pesquisa, apoiando a comunidade
científica em que está inserida. Por meio de uma pesquisa descritiva de
abordagem quantitativa, este estudo teve como objetivo analisar o cenário atual
das bibliotecas universitárias brasileiras quanto à oferta de serviços de
gestão de dados de pesquisa. Os resultados foram ao encontro dos de Tenopir et al. (2017) em estudo similar na Europa, com a
predominância de serviços de consultoria em detrimento dos serviços técnicos,
que exigem maiores investimentos. Isso aponta para um cenário ainda inicial e
em fase de planejamento quanto à gestão dos dados como serviços.
Palavras-Chave: Gestão de dados de pesquisa. Ciência Aberta. Plano
de gestão de dados. Biblioteca universitária.
ABSTRACT
In the current
context of mass production of data by researchers, there is an increasing
discussion about the importance of data in science, especially in the context
of the new scientific paradigm: Open Science. For data to be used to its
maximum potential for scientific development, it is necessary an adequate
management. In this scenario, there is a discussion about the role of academic
libraries as pioneers in the provision of research data management services,
supporting the scientific community in which it operates. Through a descriptive
research with a quantitative approach, this study sought to analyze the current
scenario of Brazilian academic libraries regarding the provision of research
data management services. The results were in agreement
with those of Tenopir et al. (2017) in a similar
study in Europe, with the predominance of consultancy services to the detriment
of technical services, which require greater investments. This points out to a
scenario in its early stages and in the planning phase.
Keywords: Research data management. Open Science. Data
management plan. Academic library.
RESUMEN
En el contexto actual de producción masiva de datos por parte de los
investigadores, se habla cada vez más de la importancia de los datos en
la ciencia, especialmente en el contexto del nuevo paradigma científico: el de la Ciencia
Abierta. Para que los datos se utilicen en su máximo potencial para el desarrollo científico, es necesario tener un manejo adecuado de los mismos. En
este escenario, se discute el
papel de las bibliotecas universitarias
como pioneras en la prestación de servicios de gestión de datos de investigación, apoyando a la comunidad
científica en la que se insertan. A través de una investigación
descriptiva con enfoque cuantitativo, este estudio tuvo como objetivo analizar el escenario actual
de las bibliotecas universitarias
brasileñas en cuanto a la prestación
de servicios de gestión de datos de investigación. Los
resultados coincidieron con
los de Tenopir et al.
(2017) en un estudio similar en Europa, con predominio de los servicios de consultoría en detrimento de los servicios técnicos, que requieren mayores inversiones. Esto apunta a un escenario
aún inicial y en etapa de planificación en cuanto a la gestión
de datos como servicios.
No contexto atual da
produção em massa de dados por pesquisadores, fala-se cada vez mais sobre a
importância dos dados na ciência, principalmente no cenário do quarto paradigma
científico: o da Ciência Aberta (CURTY; AVENTURIER, 2017). Segundo Davis e Vickery (2007) os dados de pesquisa já são considerados a
moeda mais valiosa da ciência e, portanto, “são únicos e não podem ser
substituídos se forem destruídos ou perdidos” (SAYÃO; SALES, 2013, p.179).
Para que, então, os dados
de pesquisa não sejam perdidos ou subutilizados, é de suma importância que haja
a gestão adequada deles. Além disso, há que se considerar que os dados de
pesquisa “e as possibilidades que os mesmos representam para o avanço
científico chamaram a atenção de diversas agências de incentivo à pesquisa com
relação ao destino dos dados brutos” (LEHMKUHL et al., 2016, p. 2), como
a National Science Foundation (NSF), a National Institute of Health (NIH) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo (FAPESP), que já possuem políticas mandatórias quanto à
gestão de dados dos pesquisadores.
Segundo Tenopir et al. (2017, p. 3, tradução nossa) já que
as bibliotecas universitárias têm tradicionalmente “um papel em providenciar
acesso ao que é produzido pela universidade de diversas formas, não é
surpreendente que a gestão de dados de pesquisa seja um problema mundial para
as mesmas”. Considerando o contexto citado, este estudo buscou analisar o
cenário atual das bibliotecas universitárias brasileiras quanto à oferta de
serviços de gestão de dados de pesquisa, uma vez que o tema já é amplamente
debatido internacionalmente, mas segundo Oliveira e Silva (2016), é ainda
incipiente no Brasil.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Segundo Oliveira e Silva
(2016, p. 6), “A ciência aberta é o fio condutor de investigações científicas
apoiadas por uma ciberinfraestrutura tecnológica e
metodológica que permite o uso, reuso e reprodutibilidade de dados de
pesquisa”. Esses dados possuem várias definições, características e aspectos
diferentes, e segundo a Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD (2007,
p. 13, tradução nossa) eles são: “Registros factuais usados como fontes
primárias na pesquisa científica, e que são geralmente aceitos na comunidade
científica como sendo necessários para validar os resultados de pesquisa”.
Dados de pesquisa e
Ciência Aberta estão, portanto, intimamente relacionados. Porém, apesar dessa
importância, “os dados de pesquisa estão dispersos, mal documentados ou
inacessíveis, o que impossibilita sua reutilização em novas análises e a
obtenção de respostas a novas perguntas” (BERTIN; VISOLI; DRUCKER, 2017, p. 36).
Para que essa questão possa ser solucionada e os dados de pesquisa possam ser
acessados, compreendidos e reutilizados, agilizando o ciclo da ciência e
permitindo maior transparência, é preciso uma gestão adequada.
Segundo Sayão e Sales (2013, p. 5), as instituições e as agências
de fomento já começaram a entender que os dados de pesquisa, quando
“devidamente tratados, preservados e gerenciados, podem constituir uma fonte
inestimável de recursos informacionais”. Sendo assim, pode-se definir gestão de
dados de pesquisa, de acordo com Whyte e Tedds (2011, tradução nossa) como “a organização dos dados,
desde a sua entrada no ciclo de pesquisa até a disseminação e arquivamento dos
valiosos resultados”, o que envolve diversas etapas e processos, como, por exemplo,
a descrição e preservação dos dados em infraestruturas tecnológicas.
Nesse sentido, e
considerando que “a gestão de dados de pesquisa tem assumido crescente
relevância no cenário científico internacional, na medida em que proliferam
estudos que demonstram os benefícios a ela associados” (PIWOWAR; DAY; FRIDSMA,
2007), surge a necessidade de novos serviços que se enquadrem nesse cenário.
Serviços estes que, segundo Tenopir et al.
(2017) devem ser ofertados pelas bibliotecas universitárias, instituições que
tradicionalmente têm esse papel de apoio aos pesquisadores e à comunidade
acadêmica.
3 METODOLOGIA
Os dados foram coletados
e analisados a partir do questionário on-line elaborado no Google Forms baseado em estudo similar de Tenopir
et al. (2017). O questionário foi enviado para todas as bibliotecas da
amostra, composta pelas 10 primeiras bibliotecas do Ranking Universitário Folha
(RUF)[1]
de 2018, e recebeu um total de 6 respostas. Foi composto por 10 perguntas
objetivas, divididas em 3 blocos, sobre os possíveis serviços de gestão de
dados ofertados pelas instituições. O questionário também buscou analisar o
cenário institucional quanto aos profissionais que trabalham com essa demanda e
coletar a opinião dos respondentes sobre a importância dos serviços de gestão
de dados para suas instituições, apoiando-se na Escala psicométrica de Likert (1932). A pesquisa configura-se, portanto,
como descritiva, de abordagem quantitativa.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
No bloco 1 as bibliotecas
foram questionadas quanto aos serviços de gestão de dados em suas instituições.
O primeiro tipo de serviço a ser analisado foi o de consultoria, conforme
mostra o Gráfico 1. A taxa de respostas “sim, a nossa biblioteca já oferece”
foi similar para 4 dos 5 serviços listados, demonstrando um processo similar
entre as instituições da amostra quanto aos investimentos nesses serviços. A
“colaboração com outras instituições que oferecem serviços de gestão de dados” foi
o menos ofertado. O serviço “Consultoria para a comunidade acadêmica da sua
instituição em PGD” é ofertado por três de seis bibliotecas, sendo um bom
indicador, uma vez que os PGDs são documentos
mandatórios para algumas agências de fomento para que haja o financiamento das
pesquisas.
Gráfico
1: Serviços
de consultoria
Fonte: Adaptado de Tenopir et al. (2017).
Quando aos serviços de capacitação oferecidos, o resultado
se mostrou bem diferente, conforme mostra o Gráfico 2. A opção mais assinalada foi
“não, mas planeja oferecer nos próximos anos”, o que indica um estágio ainda de
planejamento e estruturação. O “Envolvimento com o desenvolvimento de políticas
ou planejamento estratégico para esses serviços”, que consiste na elaboração de
documentos, guias e formalizações destes serviços, foi o serviço de capacitação
mais indicado como já ofertado, o que demonstra novamente o estágio de
estruturação e planejamento.
Quanto aos serviços de treinamento, o número de respostas
“já oferece” é menor, o que faz sentido ao considerar que as bibliotecas ainda
estão capacitando seu pessoal para isso, conforme constatou-se no Bloco 2 do
questionário. 33,3% das bibliotecas ainda não ofereceram oportunidades para
bibliotecários desenvolverem capacidades em serviços de dados de pesquisa. Das
66,7% que oferecem oportunidades, as mais citadas foram “Apoio para que os
funcionários fossem a workshops ou conferências em serviços de dados de
pesquisa” e “Apoio para que os funcionários participassem de grupos de trabalho
relacionados a esses serviços”.
Gráfico
2: Serviços
de capacitação
Fonte: Adaptado de Tenopir et al. (2017).
Essa capacitação dos funcionários se torna ainda mais
importante considerando que quando questionados sobre a contratação de pessoal
para os serviços de gestão de dados, todas as bibliotecas responderam que não
contrataram. O foco das bibliotecas não está em novas contratações para essa
demanda, mas sim na capacitação dos funcionários já existentes. Além disso, três
bibliotecas alegaram já fazerem colaborações com centros de Tecnologia da
Informação (TI) e duas colaboram com outros departamentos da universidade em
prol desses serviços.
Por fim, o Gráfico 3 mostra a oferta dos serviços técnicos.
“Criar guias, manuais e afins para conjunto de dados/repositórios de dados” e
“suporte técnico aos sistemas de serviços de dados de pesquisa, como
repositórios de dados” foram os mais assinalados como “já oferece”, o que pode
representar uma tendência de investimento em infraestruturas tecnológicas para
preservação dos dados. Apesar disso, os repositórios também estão em fase
inicial, contando ainda com poucos dados para consulta. Entretanto, os dados estão
em acesso aberto, o que demonstra também a preocupação com o novo paradigma da
Ciência Aberta. Os serviços técnicos foram, portanto, os menos assinalados com
“sim, a nossa biblioteca já oferece”.
Gráfico
3: Serviços
técnicos
Fonte: Adaptado de Tenopir et al. (2017).
Os resultados aqui encontrados vão ao encontro dos de Tenopir et al. (2017) em estudo com as bibliotecas
universitárias da Association of European Research
Libraries (LIBER). Os autores alegam que “mais
bibliotecas Europeias estão atualmente oferecendo ou planejando oferecer
serviços de consultoria ou de capacitação que técnicos ou práticos” (TENOPIR et
al., 2017, p.2, tradução nossa). A taxa mais baixa e lenta de oferta de
serviços técnicos em comparação com os serviços de consultoria/capacitação pode
refletir o fato de que esses serviços exigem um investimento substancial que
muitas bibliotecas universitárias não têm à disposição (TENOPIR et al.,
2017), o que se repete no cenário brasileiro.
Por fim, no Bloco 3, o objetivo era analisar a opinião dos
respondentes com relação a alguns pensamentos que são difundidos sobre a gestão
de dados enquanto serviços em bibliotecas. Com a análise dos dados foi possível
observar que, para os respondentes, esses serviços são de suma importância para
a biblioteca e para a instituição, estando, inclusive, vinculados com a
relevância das mesmas e com a possibilidade de conseguir investimentos
financeiros futuros. Pode-se, portanto, presumir que mesmo as bibliotecas que
ainda não ofertam serviços de gestão de dados de pesquisa, já reconhecem a
necessidade de ofertá-los no futuro próximo para acompanhar o cenário internacional
e apoiar sua comunidade acadêmica.
4 CONCLUSÃO
No cenário atual da
produção de dados em massa por pesquisadores, dados esses que são, segundo
Davis e Vickery (2007), a moeda mais valiosa da
Ciência, tem-se a importância da gestão, que já é uma tendência mundial. Por
conseguinte, surgem estudos buscando avaliar serviços de gestão de dados de
pesquisa, intimamente ligados com as bibliotecas universitárias ao redor do
mundo.
Neste estudo foi possível
aferir que a gestão de dados de pesquisa enquanto serviços ofertados pelas
bibliotecas universitárias ainda está em estágio inicial no Brasil. Houve uma maior
concentração em serviços de consultoria, o que vai ao encontro dos resultados de
Tenopir et al. (2017) em estudo semelhante na
Europa. Em contrapartida, os serviços técnicos, que demandam maiores
investimentos de tempo e recursos financeiros, além de parcerias e habilidades
técnicas, são os menos ofertados. Além disso, as bibliotecas não estão
contratando funcionários novos para esses serviços, mas sim adotando o caminho
da capacitação dos já contratados.
Mas, apesar desses
resultados no Bloco 1 e 2, quando questionados sobre a importância desses
serviços nas instituições em que trabalham (Bloco 3), os respondentes afirmaram
já reconhecer a necessidade da gestão de dados dentro do cenário internacional
do quarto paradigma científico: a Ciência Aberta. Em estudos futuros, para
melhor visualização do cenário atual das bibliotecas universitárias, o
questionário poderia ser aplicado em amostras maiores, contendo maior
representatividade de regiões e instituições. Ademais, pode-se buscar aferir se
novos serviços de gestão de dados estão sendo desenvolvidos pelas
mesmas.
REFERÊNCIAS
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