Mapeamento do conhecimento crítico para a formação do bibliotecário: uma abordagem metodológica

 

Mapping critical knowledge for librarian training: a methodological approach

 

Mapeo del conocimiento crítico para la educación bibliotecaria: un enfoque metodológico

 

 

Celia Regina Simonetti Barbalho

Universidade Federal do Amazonas-UFAM

Brasil

 

Danielly Oliveira Inomata

Universidade Federal do Amazonas-UFAM

Brasil

 

Tatiana Brandão Fernandes

Universidade Federal do Amazonas-UFAM

Brasil

 

 

Submetido em: 06/10/2021

Aceito em: 30/11/2021

Publicado em: 31/12/2021

Licença:

 

 

Autor para correspondência: Celia Regina Simonetti Barbalho

Email: simonetti@ufam.edu.br

ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4657-9156

 

 

Como citar este artigo:

BARBALHO, Celia Regina Simonetti; INOMATA, Danielly Oliveira; FERNANDES, Tatiana Brandão. Mapeamento do conhecimento crítico para a formação do bibliotecário: uma abordagem metodológica. REBECIN, São Paulo, v. 8, p. 01-26, 2021. DOI:   10.24208/rebecin.v8i.292 

RESUMO

 

Este artigo apresenta a composição de uma metodologia para o mapeamento do conhecimento crítico necessário à formação do profissional bibliotecário sob o ponto de vista dos docentes e egressos do curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Amazonas. Tal metodologia baseia-se nos preceitos da Gestão do Conhecimento adaptando suas estratégias ao ambiente acadêmico. Para isto, ela foi elaborada em duas etapas: a primeira com o estudo e a composição dos instrumentos aplicados aos discentes e egressos, apresentando questões abertas e fechadas de múltipla escolha, levando em consideração as disciplinas e os conteúdos apresentados no Projeto Pedagógico do Curso da Universidade, mas também distribuídas em eixos temáticos apontados pelos trabalhos desenvolvidos pela Associação Brasileira de Educação em Ciência da Informação. A segunda etapa compreendeu a aplicação dos pré-testes para validação dos instrumentos e a submissão da pesquisa ao Comitê de Ética da Instituição. O resultado descreve uma metodologia capaz de estudar e identificar o conhecimento crítico, aplicado ao ambiente educacional, visando contribuir para a discussão de um projeto de formação profissional que contemple esse conjunto de conhecimentos necessários à formação do bibliotecário.

 

Palavras-chave: Conhecimento Crítico; Gestão do Conhecimento; Metodologia; Biblioteconomia.

 

ABSTRACT

 

This article presents the composition of a methodology for mapping the critical knowledge necessary for the training of professional librarians from the point of view of professors and graduates of the librarianship course at the Federal University of Amazonas. Such methodology is based on the precepts of Knowledge Management, adapting its strategies to the academic environment. For this, the methodology was developed in two stages, first with the study and preparation of instruments applied to students and graduates with open-ended and multiple-choice questions, taking into account the subjects and contents presented in the Pedagogical Project of the University Course, but also distributed in thematic axes pointed out by the works developed by the Brazilian Association of Education in Information Science. The second stage involved the pre-test and validation of the instrument and submission to the Institution's Ethics Committee. The result is a methodology capable of studying and identifying critical knowledge, applied to the educational environment aiming to contribute to the discussion of a professional training project that contemplates this set of knowledge necessary for librarian training.

 

Keywords: Critical Knowledge; Knowledge Management; Methodology; Librarianship.

 

RESUMEN

Este trabajo presenta la composición de una metodología para el mapeo del conocimiento crítico necesario para la formación del profesional bibliotecario bajo el punto de vista de los profesores y graduados del curso de Bibliotecología de la Universidad Federal de Amazonas. Dicha metodología se basa en los preceptos de la Gestión del Conocimiento adaptando sus estrategias al entorno académico. Para ello, se desarrolló en dos etapas: la primera con el estudio y composición de los instrumentos aplicados a los estudiantes y graduados, presentando preguntas abiertas y cerradas de opción múltiple, teniendo en cuenta los temas y el contenido presentado en el Proyecto Pedagógico del Curso Universitario, pero también distribuido en ejes temáticos señalados por el trabajo desarrollado por la Asociación Brasileña de Educación en Ciencias de la Información. La segunda etapa consistió en la aplicación de pruebas previas para validar los instrumentos y la presentación de la investigación al Comité de Ética de la institución. El resultado describe una metodología capaz de estudiar e identificar el conocimiento crítico, aplicado al ámbito educativo, con el objetivo de contribuir a la discusión de un proyecto de formación profesional que contemple este conjunto de conocimientos necesarios para la formación de los bibliotecarios.

Palabras-clave: Conocimiento crítico; Gestión del conocimiento; Metodología; Biblioteconomía.

 

1 INTRODUÇÃO

 

O conhecimento é reputado como um dos principais recursos de produção, fonte de vantagem competitiva sustentável, criação de valor e riqueza (NONAKA; TOYAMA; KONNO, 2000). Fortalecida pela economia do capitalismo cognitivo, que é baseado no conhecimento derivado da força coletiva e cooperativa do trabalho, a materialização de bens intangíveis sentenciou as organizações a adotarem uma postura proativa para assegurar a mobilidade a partir da dinâmica imposta pela relevância atribuída à informação e ao conhecimento enquanto recursos fundamentais.

Neste contexto, a Gestão do Conhecimento (GC) passou a ser considerada como um recurso estratégico que pode ser adotado por qualquer organização e por diferentes ambientes de gestão que contemplem a modelagem dos seus processos baseada na captação de conhecimento e na constante melhoria de desempenho das organizações, trazendo vantagem competitiva em relação às outras instituições, além de garantir a sua sobrevivência, o lucro e a expansão no mercado (DAVENPORT; PRUSAK, 1998; DRUCKER, 1999; NONAKA; TAKEUCHI, 1997). No Brasil, assim como em países emergentes, essa afirmação fica ainda mais evidente, pois se reconhece o uso eficiente do conhecimento como forma de desenvolvimento (DÁVILA; DURST; VARVAKIS, 2018).

A GC nas organizações, sejam elas privadas ou públicas, pode ser implementada por meio de modelos de gestão do conhecimento tradicionalmente descritos na literatura por autores como Nonaka e Takeuchi (1995), e por outros mais contemporâneos como Apo (2020), e adaptados para as instituições públicas, como apresenta Batista (2012), juntamente com as diversas práticas e ferramentas de GC. Contudo, a implantação de qualquer modelo só terá eficácia se a instituição conhecer exatamente os recursos a serem geridos. Neste sentido, o mapeamento do conhecimento crítico torna-se um elemento primordial para a GC e imprescindível para o bom desempenho de um grupo e para a execução do trabalho colaborativo, sendo considerado como todo aquele que é estratégico, relevante, que garante estabilidade e perenidade às organizações. Ele se faz presente em todas as instituições, inclusive nas educacionais, sobretudo, naquelas de ensino superior, contribuindo para o impacto na formação acadêmica, na extensão, na pesquisa e no desenvolvimento tecnológico. Desse modo, as instituições de ensino superior estão no negócio do conhecimento intensivo, uma vez que estão envolvidas na sua criação, disseminação e aprendizagem (ROWLEY, 2000).

Nesse contexto da GC, esse levantamento configura-se como uma forma sistemática e deliberada de buscar identificar e avaliar os conhecimentos que agregam valor e aqueles que apresentam riscos para a continuidade das ações da instituição de ensino.

O processo educacional constitui-se em um cenário dinâmico no qual, cada vez mais, a colaboração e o compartilhamento se configuram como elemento propulsor para que o conhecimento se transforme em um instrumento que habilita para a qualificação, tanto nas dimensões das organizações, quanto na questão do desenvolvimento humano.

Nesse sentido, a GC apresenta-se como uma estratégia capaz de contribuir com o processo educacional tanto no contexto da gestão da instituição como um todo, baseando sua gestão em processos de conhecimento, como também no ambiente da sala de aula, na gestão do currículo e da proposta pedagógica, na concepção do projeto de avaliação institucional baseada no conhecimento. Ademais, instituições educacionais como as universidades devem atentar para o uso de metodologias e sistemas que lhes permitam não só identificar o conhecimento e o potencial de seu talento humano, mas também promover redes, para acessar, usar, transferir, trocar e criar conhecimentos (JURADO, 2013). Para isso, a literatura tem exposto que algumas metodologias de mapeamento do conhecimento crítico podem contribuir de maneira significativa para a otimização da formação profissional, desde que sejam relacionadas aos conteúdos curriculares ou outras questões referentes ao projeto de formação institucional. 

Nesse sentido, o objetivo geral deste estudo consiste na exposição de uma metodologia que possa mapear o conjunto de conhecimentos considerados estratégicos (críticos) para a formação do profissional de Biblioteconomia a partir do olhar de docentes e egressos do curso da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) com vistas a constituir um modelo que possa ser replicado para a formação no âmbito da graduação. Para tanto, delineia-se como objetivos específicos: identificar, na literatura, competências centrais e conhecimentos-chave para a atuação do bibliotecário; compor um mapa dos conhecimentos-chave para a formação desejada; identificar os nichos entre os conhecimentos críticos identificados pelos docentes e egressos com a formação recebida.

Visando atender aos objetivos propostos, este estudo está constituído de duas partes: a) revisão da literatura sobre os aspectos que envolvem a temática central: gestão do conhecimento crítico; b) descrição dos aspectos metodológicos que constituíram as trilhas percorridas, de modo a expor a proposta de sistematização da abordagem no contexto educacional, sobretudo para o planejamento da oferta de formação de profissionais bibliotecários.

 

2 A CRITICIDADE DOS CONHECIMENTOS NAS ORGANIZAÇÕES

 

Conhecimento é toda informação em ação efetiva focada nos resultados (DRUKER, 1999). Esses conhecimentos classificam-se como explícitos e tácitos, sendo este último o mais difícil de capturar. Ao considerar que os conhecimentos organizacionais são formados pelos individuais dos colaboradores, se a organização tem acesso aos principais conhecimentos, ela atenderia melhor os seus clientes, aumentaria a sua produtividade, seria mais dinâmica e apta a reagir mais rapidamente às mudanças, poderia ser mais inovadora.

No contexto da Gestão do Conhecimento organizacional, é o conhecimento importante ou crítico que precisa ser acessado, compartilhado, aplicado e desenvolvido pelos colaboradores, devendo ser este o conhecimento que deve ser externalizado. Em um intenso fluxo de informações e conhecimentos, é evidente que não são todos eles que necessitam ser externalizados e codificados, pois isso seria simplesmente impossível e ineficaz. O conhecimento a ser codificado é aquele considerado crítico para o desenvolvimento e aplicação na organização, pois faria uma grande diferença no desempenho organizacional. É aqui que as bases explícitas de conhecimento podem ser criadas com eficácia (APO, 2020). Enquanto o conhecimento do fluxo de trabalho geralmente reflete a quantidade de conhecimento compartilhado, o conhecimento crítico reflete a mais alta qualidade do conhecimento compartilhado (HUANG; CUMMINGS, 2011).

Os conhecimentos críticos são aqueles considerados estratégicos para a organização, são recursos com alto valor agregado, de difícil acesso, mas essenciais para o alcance dos objetivos e a visão da empresa, e são importantes para a condução das atividades no presente e no futuro das organizações, por isso a sua identificação por meio do mapeamento torna-se elemento essencial para a gestão do conhecimento nestes ambientes (INOMATA et al., 2019).

No mundo corporativo, a identificação dos conhecimentos críticos possibilita o estabelecimento de novas rotinas e práticas para as organizações. No entanto, o a sua aplicação seu surgimento aplicado nas organizações privadas, nos últimos anos, acompanhou a adaptação dos modelos de GC para o setor público, por exemplo (BATISTA, 2012).

Conceitualmente, conhecimento crítico consiste na informação, o know-how ou o feedback, elementos que influenciam diretamente na contribuição para os resultados da organização, uma vez que ele representa a experiência, as ideias ou percepções vitais que permitem a conclusão bem-sucedida de uma tarefa (HUANG; CUMMINGS, 2011). Em síntese, é todo conhecimento que é relevante para a execução da estratégia de uma organização, que fornece vantagem competitiva, e que é difícil de ser recuperado, bem como reduz riscos significativos para o negócio. Dessa forma, as organizações que realizam a gestão adequada dos conhecimentos críticos em seu processo de criação de valor reduzem os riscos de perda de competências essenciais e evitam a reinvenção de know-how de seus colaboradores (INOMATA et al., 2019).

Por muito tempo, a GC foi empregada pelas instituições para dimensionar o que efetivamente sabiam, ou seja, trazer para o nível consciente o que elas sabem fazer, mas que, até certo ponto, esse saber nunca havia sido sistematizado de forma que elas tivessem algum controle sobre ele. Posteriormente, elas passaram a apreciar os elementos que permitissem compreender como seriam capazes de fazer o melhor uso do conhecimento que possuem (CEPEDA-CARRION et al., 2017). Deste modo, as instituições constituíram importantes esforços para poder adquirir, representar, reter e gerenciar o conhecimento de forma a consolidar procedimentos sistemáticos para gerenciá-lo.

Cepeda-Carrion et al. (2017) apontam que o processo de gestão do conhecimento envolve aspectos críticos relacionados com a: a) capacidade de absorção, envolvendo a exploração de novas informações que venham a gerar novos conhecimentos ou a substituir os existentes; b) transferência de conhecimento, ou seja, a troca entre indivíduos ou grupos, de indivíduos para fontes explícitas, e de um grupo para a instituição, de modo a promover a apropriação coletiva dos saberes existentes; c) aplicação do conhecimento como um processo relevante para gerar benefícios à instituição, contribuindo para sua eficácia. 

Dada a complexidade desses três aspectos críticos que envolvem a GC, sugere-se que se trata de um processo dinâmico e contínuo implementado ao longo de um período e vinculado às relações e capacidades humanas, capaz de favorecer a identificação e a avaliação do conhecimento e contribuir para a decisão das diferentes ações da Gestão do Conhecimento que podem ser aplicadas, inclusive no contexto acadêmico.

 

3 O MAPEAMENTO DE CONHECIMENTOS APLICADOS À GESTÃO ACADÊMICA

 

A criticidade de conhecimentos equivale aos conhecimentos críticos, os quais podem ser demonstrados por meio de mapas, que, por sua vez, têm por finalidade estruturar os conhecimentos e o acesso às suas fontes em função de seus domínios (INOMATA et al., 2019). Com o mapeamento do conhecimento, é possível descobrir a localização, o valor e o uso do conhecimento organizacional (ERMINE; BOUGHZALA; TOUNKARA, 2006). Sendo assim, as fontes de conhecimentos críticos são consideradas recursos essenciais e usadas pelos processos de agregação de valor de uma empresa (GRUNDSTEIN; ROSENTHAL-SABROUX, 2008).

A principal função do mapeamento de conhecimentos é mostrar aos colaboradores da organização para onde ir quando necessitarem do conhecimento, sendo este seu maior benefício (DAVENPORT; PRUSSAK, 1998). Vale destacar que o mapa, como o próprio nome esclarece, irá indicar o conhecimento, mas não o contém, pois se trata de um guia e não de um repositório de conhecimentos. Ainda assim, esta é uma ferramenta fundamental para sintetizar o conhecimento disperso na organização e que orienta onde encontrá-lo. Como destacado por Schlesinger et al. (2008), o mapa de conhecimento está fortemente ligado à combinação dos processos de socialização e externalização de conhecimentos, portanto, de síntese e localização do conhecimento organizacional, além de auxiliar na identificação de especialistas ou fontes de conhecimentos (PROBST; RAUB; ROMHARDT, 2002).

Na ambiência das universidades, onde o mapeamento de conhecimentos é uma abordagem recente, algumas iniciativas foram encontradas na literatura, relativas ao uso de mapas conceituais para a gestão do conhecimento nas universidades (GARCIA; VALENTIM, 2009), quais sejam: a utilização do Balanced Scorecard (BSC) nas universidades (PEREIRA; PEREIRA; MONTEIRO, 2015), a implementação de mapas estratégicos em departamento acadêmico (CUGINI; MICHELON; PILONATO, 2011), a identificação de características de organizações intensivas em conhecimento em universidades (ALVES et al., 2008), a gestão do conhecimento científico em universidades (LEITE, 2006; MARTINELLI et al., 2017). Também foram identificados estudos acerca do mapeamento de conhecimentos por profissionais da informação nas organizações (HOMMERDING; VERGUEIRO, 2004),

O conhecimento é valioso para a instituição universitária. Portanto, constitui-se no conhecimento coletivo da organização e pode ser utilizado para agregar valor a esta instituição (GARCIA; VALENTIM, 2009). Ademais,

 

[...] a construção de conhecimentos, como papel da universidade, que na economia contemporânea é o de formar o trabalhador do conhecimento, compreende também uma reconstrução das significações, possibilitando que esse tipo de instituição se torne, cada vez mais, uma organização intensiva em conhecimento (ALVES et al., 2008, p. 4).

 

De fato, como expõem os autores, o emprego da gestão do conhecimento no contexto acadêmico contribui para o desenvolvimento deste capital e para que a instituição de ensino superior reforce seu papel na teia social de construção de saberes, como apontam Garcia e Valentim (2009, p. 9):

[...] nas universidades públicas, não só agrega valor à instituição em si, mas a sociedade como um todo. Sendo um órgão público, a universidade pública tem a responsabilidade em devolver à sociedade os investimentos feitos com dinheiro público. Assim, a GC em uma universidade pública pode, também, implicar na qualidade de serviços, diretos e indiretos que a universidade oferece à sociedade.

 

 As estratégias e ferramentas para a identificação, localização e manutenção dos conhecimentos organizacionais, sob o prisma da sintetize de conhecimentos de alta criticidade para os negócios organizacionais e para o cumprimento de sua missão e objetivos, são essenciais para uma gestão acadêmica e administrativa em todas as suas dimensões. Pereira et al. (2011) detalham que a gestão acadêmica universitária compreende duas modalidades descritas como administração educacional, a qual compreende os serviços administrativos e de infraestrutura, que envolve a dimensão acadêmica. Para os autores, essas modalidades constituem um campo complexo de trabalho para os gestores universitários, cuja ação exige a aquisição de competências administrativas, técnicas e humanas (SOUZA, 2008).

Na esfera dos cursos de graduação, o mapeamento do conhecimento crítico pode orientar os múltiplos processos que envolvem a atividade de formação, planejados pela coordenação e pelo corpo docente dos cursos.

 

4 PLANEJAMENTO E ELABORAÇÃO DO PERCURSO METODOLÓGICO

 

Visando descrever de modo efetivo o percurso traçado, este tópico apresenta a caracterização da pesquisa, os elementos que ampararam a construção do instrumento de coleta de dados primários, as estratégias para a coleta de dados e os elementos que compuseram esta abordagem metodológica.

 

4.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA

 

Esta pesquisa, exploratória e descritiva, buscou identificar os conhecimentos críticos que possuem maior relevância para a formação do bibliotecário e a relação destes com os conteúdos disponíveis no currículo do curso de Biblioteconomia da UFAM.

O estudo exploratório, neste caso, permite ampliar a compreensão sobre as condições que nortearam a sistematização de procedimentos amparados nos preceitos da gestão do conhecimento, especialmente daqueles que são críticos, com a perspectiva de averiguar seu contributo para o planejamento da oferta de conteúdos para a formação almejada. Como não se identificou estudos semelhantes em instituições de ensino superior que aplicaram o mapeamento de conhecimento crítico para o planejamento da formação, a metodologia desenvolvida nesta pesquisa poderá servir como fundamento para novas pesquisas semelhantes, o que contribuirá para validar os procedimentos para outros contextos educacionais.

As interpelações realizadas por meio do levantamento, da descrição e da análise dos conhecimentos críticos para a formação de bibliotecários caracterizam o estudo como descritivo, especialmente por se tratar de uma pesquisa que foi realizada com a aplicação de questionários dirigidos a dois grupos estudados: os docentes e os egressos, que não apontaram as condições para elegerem aqueles que consideram mais relevantes.

 

4.2 UNIVERSO, AMOSTRA E SUJEITOS

 

         Os estudos sobre o mapeamento de conhecimento crítico com estratégia de GC apontam que qualquer constructo deve considerar variáveis do ambiente externo, interno e da memória organizacional. Deste modo, para o levantamento de informações primárias, a pesquisa considerou:

a)   As opiniões dos docentes do curso de Biblioteconomia, assumindo que estes sujeitos compõem o ambiente interno da formação, uma vez que eles, em última instância, discutem, constroem e implantam o projeto de formação. Em função do número reduzido de docentes do curso de Biblioteconomia da UFAM, não foi constituída uma amostra para a pesquisa, sendo considerados como sujeitos os nove docentes do curso: oito professores efetivos e um professor substituto;

b)   A posição dos egressos do curso, entendidos nesta pesquisa como representantes do ambiente externo. Do total de 148 egressos formados pela estrutura curricular vigente de 2009, que é objeto de análise da pesquisa, foi composta uma amostra aleatória de 58 bibliotecários, adotando como critério de seleção a disponibilidade em participar da pesquisa. Os egressos foram identificados a partir do sistema de controle da UFAM, de onde foram extraídos os nomes e os e-mails. Posteriormente, a lista foi enviada para o Conselho Regional de Biblioteconomia da 11ª Região (CRB11) para a checagem dos e-mails daqueles profissionais que estavam na base de dados da instituição, tendo em vista a necessidade de dados atualizados para o envio do instrumento de coleta de dados.

 

4.3 ELABORAÇÃO DO INSTRUMENTO PARA COLETA DE DADOS PRIMÁRIOS

 

A elaboração dos instrumentos para coleta de dados foi precedida da análise dos seguintes documentos:

a)   Da memória institucional:

                        i)         Resolução nº 029 de 14/11/1966 do Conselho Universitário (CU) da então Universidade do Amazonas (UA), com o intuito de compreender os elementos que pautaram a sua criação;

                      ii)         Projeto de Desenvolvimento Institucional (PDI) da Universidade Federal do Amazonas, bem como o Projeto Pedagógico Institucional (PPI), para mensurar os conteúdos da proposta pedagógica da instituição que amparam a construção do projeto do curso de Biblioteconomia;

                    iii)         Projeto Pedagógico do Curso (PPP) do ano de 2009, objetivando identificar os conteúdos ministrados e agrupá-los a partir dos eixos dimensionados pelos documentos da ABECIN.

b)   Do ambiente externo:

                       i)         Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Biblioteconomia, estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação (Parecer CNE/CES nº 492/2001, aprovado em 3 de abril de 2001), visando compreender a totalidade da legislação em vigor acerca dos conteúdos exigidos para a formação do profissional bibliotecário;

                      ii)         Documentos da ABECIN, especialmente aquele intitulado “Projeto pedagógico e avaliação da graduação: referências para a renovação e ressignificação do ensino em Biblioteconomia/Ciência da Informação” (2001), que dimensiona as orientações para a organização do projeto pedagógico, bem como reflete as recomendações oriundas do Encuentro de Directores y de Docentes de Escuelas de Bibliotecología y Ciencia de la Información del MERCOSUR e dos Encuentros de Educadores e Investigadores en Bibliotecologia, Archivologia, Ciencia de la Información y Documentación de lberoamerica y el Caribe (EDIBCIC);

                    iii)         Projeto pedagógico do curso de bacharelado em Biblioteconomia na modalidade a distância da CAPES/UAB, visando compreender a dinâmica da oferta de conteúdos a partir dos eixos temáticos dimensionados pela proposta.

 

A análise desses documentos amparou a elaboração dos instrumentos para os docentes e para os egressos, ambos compostos considerando os conteúdos ofertados e os Eixos Temáticos que foram extraídos das orientações emanadas da ABECIN, conforme dispõe o Quadro 1.

Quadro 1 - Eixos Temáticos para os cursos de Biblioteconomia

 

TEMÁTICAS

CONTEÚDO MINISTRADO

EIXO 1

Fundamentos teóricos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação

Bases históricas e epistemológicas da área da Biblioteconomia.

EIXO 2

Organização e Tratamento da Informação

Conceitos, métodos, técnicas e instrumentos para análise, síntese, condensação e representação da informação, em suas vertentes temática e descritiva.

EIXO 3

Recursos e Serviços de Informação

Fundamentos, modelos, métodos, técnicas, instrumentos e recursos no desenvolvimento de serviços e produtos de informação e ação cultural.

EIXO 4

Gestão de Unidades de Informação

Conceitos, modelos, métodos, técnicas, instrumentos e recursos para coordenação, direção, gerenciamento, planejamento, controle e avaliação de plataformas, redes, sistemas, ambientes, serviços e produtos informacionais.

EIXO 5

Tecnologia de Informação e de Comunicação

Conceitos, modelos, métodos, instrumentos e recursos de tecnologia de informação e de comunicação para o desenvolvimento, a implantação e a avaliação de recursos tecnológicos a exemplo de plataformas, redes, repositórios, bases de dados, bibliotecas eletrônicas e digitais, publicações eletrônicas e digitais, OPAC, etc.

EIXO 6

Pesquisa em Biblioteconomia e Ciência da Informação

Fundamentos teóricos e metodológicos para a construção de conhecimento no âmbito da Biblioteconomia.

EIXO 7

Estágios e atividades complementares

Prática profissional e identificar possíveis áreas de atuação e especialização. Ampliar os conhecimentos inter-relacionados a sua área de atuação.

 Fonte: Adaptado de Brasil (2017).

 

Os assuntos que envolvem o Eixo 7, referente ao Estágio e às Atividades Complementares, por se configurarem como a prática de todos os conteúdos ministrados, não foram objeto da composição do instrumento.

A partir do estudo das bases teóricas sobre o conhecimento crítico e do exame dos documentos descritos, com especial atenção aos conjuntos de conteúdos a serem abordados na formação, elaborou-se uma proposta de instrumento para os egressos contemplando uma lista de assuntos essenciais para a formação que constam da proposta pedagógica do curso em análise, organizada pelos eixos dispostos no Quadro 1.

Em uma escala de 1 a 4, considerando (1) sem importância, (2) pouco importante, (3) importante e (4) muito importante, o sujeito identificou o conjunto de conteúdos postos em análise, considerando a seguinte questão: Dos assuntos a seguir, quais você identifica como críticos para sua atuação no mercado de trabalho?

Ao final de cada eixo, foi disponibilizado um espaço para que fosse registrada, se o sujeito julgasse necessário, alguma sugestão ou questão importante que não tivesse sido abordada.

Deste modo, o instrumento para os egressos foi dividido em nove seções, sendo a primeira uma apresentação da pesquisa e a segunda o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), conforme determinam as orientações do Comitê de Ética da UFAM. As seções 3 a 9 foram compostas pelos seis eixos considerando as grandes áreas expostas no Quadro 1, com exceção do Eixo 7.

O instrumento para os docentes foi composto por um texto que conceitua o conhecimento crítico como um método aplicado para priorizar quais são aqueles essenciais para a formação almejada, bem como como TCLE.

O instrumento foi estruturado de forma semelhante ao dos egressos. Esse método de mensuração granular foi pensado com o intuito de medir, de acordo com a percepção dos respondentes, o grau de importância dos conteúdos listados pertencentes ao currículo do curso de Biblioteconomia, e permitiu apontar quantitativamente quais assuntos, dentro do que é apresentado aos discentes do curso, são considerados pelos docentes como conhecimentos críticos para a formação de bibliotecários.

Para a elaboração e aplicação do pré-teste e do instrumento definitivo, foi empregada a plataforma Google Forms, na qual se constituiu um formulário contendo questões fechadas de múltipla escolha e abertas. Com a finalização dos ajustes, após o pré-teste, o instrumento de coleta e o projeto de pesquisa foram submetidos ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (CEP) da UFAM para avaliação e parecer. Com a aprovação, deu-se início à coleta de dados.

 

4.3 COLETA DE DADOS PRIMÁRIOS

 

Para a coleta de dados, inicialmente, foi realizado um processo de sensibilização com os docentes e os egressos, visando divulgar os objetivos da pesquisa aos participantes, bem como destacar a importância da participação. Para tal, foram dimensionados banners virtuais (Figura 1) para anunciar o projeto e convidar os sujeitos para participar da pesquisa, informando sobre o envio do questionário para o endereço eletrônico.

Figura 1 - Material de divulgação da pesquisa

                         Fonte: Elaborado pelos autores (2020).

 

 

Foi utilizado o aplicativo WhatsApp para encaminhar as mensagens, sendo que, para enviá-las os bibliotecários, utilizou-se o grupo criado pelo Conselho Regional de Biblioteconomia da 11ª Região (CRB11), bem como o mailing da instituição. Também foram utilizadas como via de divulgação as mídias do CRB11 e o grupo de pesquisa Gestão da Informação e do Conhecimento na Amazônia (GICA), no contexto no qual a pesquisa foi desenvolvida.

O link para acesso ao instrumento foi encaminhado via e-mail e ficou disponível para resposta no período de março a abril de 2020, para os docentes, e de janeiro a junho do mesmo ano para os egressos.

 

4.4 ESTRATÉGIA DE ANÁLISE DE DADOS

 

Para a análise dos dados, os instrumentos aplicados aos docentes e egressos foram analisados a partir da interpretação quantitativa das respostas obtidas dos dados primários dimensionados a partir dos seis primeiros eixos dispostos no Quadro 1. Para cada eixo, foram arrolados os conteúdos dispostos pela escala que apontou o nível de criticidade do conteúdo para a atuação profissional.

 

5 RESULTADOS

 

         Dimensionadas as questões que envolveram o caminho metodológico percorrido, objetivo desta exposição, a consolidação da abordagem adotada está refletida no esquema exposto na Figura 2.

 

Figura 2 – Modelo preliminar de mapeamento de conhecimento crítico para a formação profissional

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

 

 

O esquema exposto na Figura 2 elenca os elementos que permeiam os conhecimentos críticos no contexto da formação profissional e que devem ser considerados para dimensionar o mapeamento daqueles que são essenciais para a consolidação do projeto educacional que reflita as expectativas dos atores envolvidos.

Este estudo relata a construção de um modelo em desenvolvimento. Os resultados iniciais mostram (i) a necessidade de identificar a origem dos conhecimentos críticos, que, no caso acadêmico, advém das pessoas inseridas nos ambientes internos e externos, de conhecimentos que podem estar estruturados nos instrumentos da universidade, como na memória organizacional, nas legislações, normas e recomendações. As fontes de informação para identificação dos conhecimentos críticos para a formação acadêmica do bibliotecário são input para (ii) o processo de avaliação por parte dos diversos atores envolvidos, que, além dos discentes e egressos, abrange formadores (professores, coordenadores, etc.) e empregadores (diversas instituições). Isso significa que conhecer o que esses atores consideram como conhecimentos críticos para a formação do bibliotecário é de suma relevância. Portanto, (iii) conhecimentos críticos para a formação, que devem ser incorporados no projeto pedagógico institucional, no projeto pedagógico do curso, nos planos de ensino, nas práticas pedagógicas, nas ações e atividades desenvolvidas nos campos de estágio.

O modelo, ainda em construção, reflete parte dos procedimentos da pesquisa com egressos e docentes, sendo necessário ainda consolidar procedimentos efetivos para que os outros atores, a saber, discentes e empregadores, possam manifestar suas posições quanto aos conhecimentos críticos para a formação de bibliotecários.

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

A aplicação dos preceitos da gestão do conhecimento na composição de uma metodologia que se adeque ao ambiente acadêmico, contribua para o planejamento de um curso de graduação e, consequentemente, oriente de forma estratégica mudanças em sua estrutura curricular poderá oferecer, a longo prazo, uma formação mais eficiente diante das necessidades do mercado de trabalho.

A metodologia aqui descrita possui limitações, haja vista a necessidade de se ouvir os discentes do curso e o próprio mercado, mas ainda está em construção e, nesta primeira etapa, em que se ouviu docentes e egressos, foi possível identificar algumas mudanças que podem ocorrer nas etapas seguintes. Ademais, os resultados parciais foram suficientes para orientar o planejamento estratégico do Curso de Biblioteconomia da UFAM. Os demais resultados, a partir da aplicação da metodologia a novos atores, poderão contribuir para a discussão de um projeto de formação profissional que contemple esse conjunto de conhecimentos necessários à formação do bibliotecário.

A abordagem metodológica apresentada poderá ainda, no futuro, ser ajustada e reproduzida nos demais cursos de Biblioteconomia da Região Norte a fim de buscar identificar as diferenças quanto à formação nos Estados e orientar ajustes e melhorias estratégicas para o planejamento da formação do profissional, buscando contribuir para uma educação mais autônoma, capacitada para o desempenho de atividades de produção, gestão e acesso à informação, e, por fim, habilitar o profissional bibliotecário a democratizar a informação. O reconhecimento do conhecimento crítico na área contribui para esse desenvolvimento.

 

REFERÊNCIAS

 

ABECIN. Projeto pedagógico e avaliação da graduação: referências para a renovação e ressignificação do ensino em Biblioteconomia/Ciência da Informação. São Paulo, 2001. 29p. (Documentos ABECIN, 1).

 

ALVES, L. et al. Identificando características de organizações intensivas em conhecimento em universidades: um estudo de caso nas Instituições do Sistema ACAFE de Santa Catarina-Brasil. In: COLOQUIO INTERNACIONAL SOBRE GESTIÓN UNIVERSITARIA EN AMÉRICA DEL SUR, 8., 2008, Asunción, Paraguay. Anais [...]. Florianópolis: INPEAU, 2008. v. 1. p. 235-249.

 

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